a primeira longa caminhada
Não sou pessoa de estar horas no sofá a dormir, a ver TV, ou até a ler.
Depois de caminhar cerca de 30 km entre Braga (centro) e Trofa, pela N14, o meu corpo quer sofá e cadeira.
Combináramos repetir esta experiência, mas desta vez, viajaríamos de comboio.
Ora, no início deste mês, a amiga C lançou o repto de fazermos o percurso a pé. Duas colegas suas fazem-no todos os anos, seria um desafio interessante fazermos também.
Quando a N ligou-me a dizer as suas intenções, comentei que não, que estava fora de questão fazer Fátima a pé.Conheço o meu corpo, os meus limites, não contassem comigo para isso.
Depois de me convencer a fazer a primeira experiência, aceitei, mas fui determinada em dizer que dificilmente irei na peregrinação a Fátima.
O objectivo é fazermos, durante vários sábados, uma distância de 30 a 50 km até completarmos os 245km que leva a caminhar entre Braga e Fátima e, na semana das comemorações, fazermos este percurso a pé.
Ora, a semana passada, tive o telefonema da N a confirmar que faríamos Braga/Trofa.
Aceitei o desafio. Primeiro pela companhia, depois por que como caminhante de estrada ( que me faz uma confusão enorme, enquanto condutora), seria um teste, também, à minha resistência.
Antes de lançar-me na aventura, li na net alguns testemunhos sobre caminhadas e caminhantes, o que vestir e calçar, como proceder durante o percurso.
Fui à Decathlon fazer umas compras.
A conselho da funcionária, que fez algumas recomendações sobre o que é mais conveniente usar, não encontrei palmilhas em silicone com o meu número de calçado, e os calcanhares "não", dissera-me ela. Comprei dois pares de meias, barras de cereias, água, chocolates.
À noite, preparei tudo. Antes de dormir, massajei os pés com vaselina para não ganhar bolhas ( bendita vaselina e meias).
Sábado às 7 h, estavamos no ponto de encontro. Uma das amigas, a P veio de Vieira do Minho. Era a primeira vez que se metia num desafio destes, também.
Coletes reflectores vestidos, saímos de Braga (centro) em direcção a Celeirós, estrada N14.
Cada uma das iniciadas, e ao seu ritmo, conversa com a, depois com b, por vezes ficávamos para trás, ou uma seguia atrás isolada. As duas veteranas levavam algum avanço, os carros passavam bem junto a nós ( foi aqui que percebi que de facto se anda depressa de mais). Quando um camião se aproximava, eu parava o mais possível na parte de dentro da berma. Quanto perigo!
Fizemos algumas paragens. Caminhos alternativos junto à estrada, só encontramos um, em Santiago da Cruz, Famalicão. Os poucos passeios que existem, são estreitos, íamos em fila.
Chegamos a Famalicão por volta das 12h, eu já não aguentava, doía-me a nádega direita, o joelho esquerdo dava sinal de dor.
A C perguntou-me se queria ficar, apanhava o comboio para Braga.
Ria-me, ao mesmo tempo que ela dizia que a Trofa não ficava a mais de 6 km.
Eu respondia que seria mais que isso, pelo menos 10km.
Cruzámo-nos com um senhor e perguntou: " O senhor pode dizer-nos se estamos muito longe de Fátima?"
O senhor deu uma gargalhada e respondeu: " Ui, eu nem lhe respondo!"
Mais à frente, perguntou a outro: " Pode dizer-me quantos quilómetros são daqui à Trofa?"
"Cerca de 6 / 7 km", respondeu.
"Acho que não, devem ser mais", comentei com a C.
Cada vez que subia e descia um passeio, a minha perna: "ai!", queixava-me eu.
Eu que dizia que nem a Famalicão chegava!
Esperávamos almoçar. A N, que fez os caminhos de Santiago, dizia: " Quero sentar-me numa esplanada, quero comer alguma coisa e beber um fino".
As veteranas não nos ouviam, seguiam muito à frente.
A ideia que tivéramos era de almoçar, recuperarmos as forças e continuar.
Estava a ser duro demais. Tínhamos mais quilómetros para andar, o joelho esquerdo queixava-se.
Já na zona industrial de Ribeirão, comentamos que devíamos ter parado para almoçar, recuperar da primeira etapa e depois continuarmos. As outras não diziam nada. À medida que caminhávamos, muitos condutores e ciclistas cruzavam-se, buzinavam e/ou diziam adeus.
As duas caminhavam com muita facilidade, não perdoavam. A C e a P seguiam atrás. Eu, a N e a P2 ficámos para trás.
Passamos a zona industrial de Ribeirão, o fim estava perto, mas cada passo que dávamos parecia que nunca mais chegávamos à meta.
Pouco antes do início da ponte que liga Ribeirão à Trofa, sentamo-nos num muro, por breves minutos. Nenhuma das outras quatro estavam à nossa vista.
De repente, vejo a N abrir a mochila e tirar de dentro uma joelheira de compressão. E diz-me: " Dói-te o joelho, deixa-me pôr esta joelheira. Alivia a dor que tens na perna."
Na verdade o joelho estava muito inchado, mal conseguia caminhar.
"Não, obrigada. Como vou eu vestir a joelheira?".
Sem que eu contasse, ajoelhou-se, vestiu-me a joelheira por cima das calças. Ajustou-a.
Uma grande fila de automóveis em direcção à Trofa atravessava a ponte, ouvimos alguém buzinar.
Uma senhora perguntou: " precisam de ajuda?"
Rimo-nos, agradecemos e respondemos que estava tudo bem. Comentou a N : " É isto que eu gosto. A simpatia das pessoas quererem prestar ajuda".
Atravessámos a ponte, encontrámos a placa em granito que nos indica que ali começa o Minho.
E nós tínhamos acabado de sair do Minho.
Continuámos o caminho, ligámos às nossas companheiras. Estavam mais à frente à nossa espera.
Tinha acabado a nossa primeira experiência. Eram 14:30h.
O que para as veteranas leva 4:30h a percorrer os 35km, levou-nos 7:20h.
Queríamos almoçar. As veteranas comentaram que tinhamos de encontrar a estação de caminhos de ferro e seguir viagem para Braga, que o comboio era às 15:15h.
Comentei que seria melhor almoçarmos, queríamos beber um fino, tinhamos tempo de chegar a Braga.
A C, que as conhece melhor, falou com elas. Decidiram esperar por nós.
Fomos comer uma sopa e uma sande de carne assada, bebemos fino.
E que bem que nos soube aquela refeição ligeira.
O comboio seguinte era uma hora depois, tínhamos tempo.
À chegada a Braga, o companheiro da C estava à nossa espera.
Tinhamos combinado ir de táxi, uma de nós ia buscar o carro e levaria as outras. Éramos sete.
Quando me chamaram para entrar no carro, perguntei como era com as duas, as veteranas. A C respondeu-me que a filha da x ia buscá-las. Mesmo assim, chamei-as e disse-lhes adeus.
Não foi simpático da parte delas não se despedirem de nós. Não gostei.
Entendo que demorou-lhes o dobro do tempo a fazer os 35km, mas elas sabiam que o resto do grupo nunca tinha
feito uma caminhada tão extensa.
Antes de regressarmos a casa, fomos ao café beber um panachê, rir um pouco da nossa aventura.
Quando me dirigia ao carro mal conseguia andar. O meu corpo estava dorido.
Cheguei a casa, tomei um banho,comi algo leve e fui para o sofá. Dexei-me ficar. Na cama deixei-me dormir estendida, não conseguia virar-me. Mas dormi bem.
Hoje ainda não estou a cem por cento.
As sms que recebi das três amigas, dizem que adoraram, que foi difícil, que com calma vão pensar na próxima etapa Uma das sms diz:
"Como estão as meninas?
Dói tudo? Pés, pernas, barriga e cabeça?
Sinal que estamos prontas para a próxima."
A próxima, segundo as veteranas, vai ser Trofa - Santo Ovídio, Vila Nova de Gaia.
Respondi:
" (...) Podes estar pronta para a próxima. Eu desisiti. Não dá, não aguento(...)."
(Mas vai ser um caso a pensar. O convívio entre nós, é bom demais).