Os meus receios
Trabalhei 14 anos na empresa da família, fundada pelo meu avô paterno, passamos por situações muito difíceis. Meu pai nem sempre trazia o seu vencimento para casa ou se o trazia não era na totalidade.
A minha mãe dizia: "faço uma ginástica para governar a casa!". Arranjou emprego dentro de casa para ajudar nas despesas dos estudos dos 6 filhos que teve. Comprou uma máquina de tricotar, fazia vestidos, camisolas, saias. Tinha boas clientes. Eu entregava as encomendas, muitas vezes à noite, à chuva, ao sol. Nunca me queixei.
Ajudava nas tarefas da casa, ia para a escola, estudava.
Depois de completar o 7º ano, actual 11º, fui trabalhar para a empresa, a convite do meu tio. Meu pai nunca se meteu, nunca me defendeu em nada.
Retomei os estudos 7 anos depois de completar o 11º ano. Fiz o 12º ano à noite.
Entrei para a universidade como trabalhadora estudante, assumi a orientação da casa nesse mesmo ano, o ano em que minha mãe nos deixou para sempre.
Passei trabalhos, dificuldades, carências. E tinha dois irmãos mais novos, adolescentes.
Sem a mãe, estudaram, formaram-se, casaram, tiveram filhos.
Acabei o curso e entrei para o ensino.
Sempre soube gerir a minha vida financeira, mesmo com algumas dificuldades. Até à hora em que tive de pedir o primeiro empréstimo da minha vida.
Um problema. Como iria eu pagar a minha casa durante 20 anos? Na altura 50 contos por mês.
O tempo foi passando. Os juros iam descendo, os pagamentos sempre em dia.
Comprei o carro, o mais barato e económico da marca. O carro que ainda tenho, há 13 anos. Mais um crédito.
Fui fazendo as minhas poupanças, através de um seguro, por 15 anos, com término em 2012.
Quando pedi o primeiro empréstimo, temi.
Decidi arrumar com o empréstimo do carro, quando apenas faltava 1 ano.
A casa está quase paga (só em 2016). Entretanto, tomei uma decisão importante na minha vida. Era algo que iria melhorar a minha pessoa, a minha autoestima.
Assumi, pedi, cumpri e cumpro.
Caminhei sempre com segurança e tranquilidade.
Agora, não sei. Temo o amanhã. Temo não poder cumprir com os meus compromissos. Temo ficar sem as minhas parcas economias.
A poupança na luz, na água, na gasolina, na roupa,no café, que tomo em casa, nos jantares (que raramente vou), nos espetáculos(que raramente assisto), entraram agora na minha rotina.
Naquele tempo, entre 1982 e 1990, os momentos mais difíceis da minha vida pessoal, familiar e económica, receei, mas não tive medo.
Hoje tenho receio e medo: de falhar, de não cumprir.