no autocarro
Fui ao ginásio, ontem, de autocarro.
Sempre que tenho tempo, prefiro ir de autocarro, poupo na gasolina, na carteira e o ambiente.
A aula de Pilates é às 11:30h, tenho cartão da TUB, a paragem fica perto de minha casa.
São cerca de 12 minutos ( ao domingo é mais rápido, há pouco trânsito) até à paragem, junto ao Continente.
Tenho de atravessar o parque de estacionamento do hipermercado, subo uma rua um pouco íngreme, que dá para o parque de estacionamento do ginásio.
Subir a rua são cerca de sete minutos ( depende do passo ).
Depois da aula, voltei à paragem, o autocarro chegava em 10 minutos.
Estava sentado no banco, um imigrante. Pele escura, pelos traços percebi que seria indiano.
O autocarro chegou.
Entretanto,chegaram mais três pessoas. Uma delas entrou, a seguir o jovem, eu e duas senhoras ficamos atrás dele.
Ele tinha passe, passou na máquina, mas esta não o lia.
O condutor do autocarro, pediu-lhe o cartão. Passou uma,duas, três, vezes, e amáquima não lia.
Pediu que esperasse para que os outros passageiros, e eu, passassemos os cartões.
Eu deixei-me estar a obervar o que o motorista dizia ao jovem.
Comentava que o cartão estaria desactivado talvez porque o tinha junto ao telemóvel.
Eu ofereci-me para pagar a viagem.
Uma senhora brasileira aproximou-se, com uma nota de 5 euros, para pagar a viagem.
O motorista disse que não era preciso que iria tentar perceber o que estava a acontecer.
O jovem não percebia nada do que ouvia, até que lhe perguntei se percebia inglês.
E resolvemos o problema.
O motorista, reparando que era um passe, pediu-me para lhe perguntar se ele tinha o recibo do valor que pagou pelo carregamento.
O jovem foi à carteira, tirou não só este como o do multibanco.
Entregou ao motorista que viu de facto o valor correspondia ao pagamento do passe por um mês, mas não percebia porque a máquina não lia.
Até que me perguntou que dia era, e à minha resposta, " dois de Março", ele respondeu de imediato que o recibo datava do dia três de Fevereiro, logo ele tinha de carregar o passe.
Perguntei se ele não tinha de pagar a viagem, ele respondeu que não.
Transmiti ao jovem que não pagava esta viagem mas que tinha de carregar o passe para o mês de Março.
Sentou-se.
Quando eu ia ocupar um dos lugares, comenta uma senhora ," A senhora sabe falar com ele". Respondi que estudara inglês.
Sentei-me atrás do jovem.
E foi então que lhe perguntei de onde era: Índia.
Comentei que compreendia que é difícil para um estrangeiro aprender português.
E dei-lhe um conselho: se tiver algum amigo que fale e compreenda portugês, que o levasse com ele à TUB e explicasse o que aconteceu. E que tenha sempre o recibo com ele.
Não fiz qualquer pergunta sobre se tem emprego, ou do tempo que está em Portugal.
Quando chegamos à paragem que eu saía, toquei-lhe ao de leve no ombro e desejei-lhe boa sorte.
Com o gesto de gratidão, olhou para mim, levando a mão direita ao seu coração.
Saí.
Nos anos oitenta, fui sozinha para a Suíça.
Arranjei emprego como baby-sitting ( ficava-se a viver em casa da família que dava emprego) para ganhar algum dinheiro, pois queria ir a uma clínica de cirurgia plástica, em Berna, e ser vista por um conceituado cirurgião.
Na altura estava no último ano do curso, interrompi para ver se realizava um sonho.
Mas não me dei bem. Sentia-me sozinha.
O miúdo, de cinco anos, era demasiado mimado. Não sabia brincar. Tinha de lhe fazer as vontades todas. E atirava-me com os bonecos articulados, fazia troça das pessoas.
Tinha o meu emprego cá, tinha o curso para acabar, não me via ficar lá por muito mais tempo.
Estive um mês e meio.
Cerca de dois anos depois, através de uma familiar que várias vezes esteve internada em Lisboa, no HSM, e sendo ela uma pessoa que travava conversa com enfermeiros e médicos, conheceu um cirurgião plástico.
E falou-lhe em mim.
Imediatamente tentou marcar uma consulta com ele.
Este meu pequeno testemunho é para mostrar que não é fácil deixar para trás a família e ir à procura de uma vida nova num lugar desconhecido. Não foi o meu caso.
As saudades são muitas, conhecer pessoas não é fácil, perceber uma língua desconhecida é muito,muito complicado.
Eu aprendi francês e inglês. Falava fluentemente, no caso, o francês.
E regressei.
E o sonho não se realizou em Berna mas no meu país.
A emigração/ imigração é um bico de obra para quem vem e para quem recebe.
Mas dá-me dó quando a língua é um entrave à socialização.