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cantinho da casa

cantinho da casa

desafio de escrita do Triptofano # 2

o carrinho de bebé

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Ainda se sentia um guarda florestal, foram  muitos anos a guardar a floresta, estava reformado, amava aquela terra, a sua floresta.
Criara os filhos, emigrantes em França, ficou viúvo e sozinho na aldeia que não teria mais de 20 pessoas, todas idosas, e a quem ele prestava ajuda nos dias mais frios. Não que ele fosse propriamente novo, já contava 70 anos,mas ainda sentia forças para andar pela floresta na companhia da Lua, a sua rafeira.
Habituara-se à solidão da floresta e da casa, mas vivia feliz ali, acendia a lareira nos dias frios. Os filhos arranjavam sempre pretexto para a pintar ou alegrar os muros com vasos cheios de flores, quando iam passar as férias de Verão. Ele mantinha-a sempre limpa e arrumada.
Sentado em frente à lareira, com a Lua ao seu lado, recordava o tempo em que subia lá acima, à torre de vigilância, e os olhos da solidão fixavam ao pormenor algum movimento, algum sinal de fumo, que ele tratava de imediato de avisar as autoridades.
Outros tempos, pensava ele.
E recordou o dia em que, numa manhã fresca de Primavera, a pouco mais de dois quilómetros da casa, acompanhado da Lua, de repente ela correu a ladrar e parou uns metros mais à frente.
Estugou o passo.
A cadela não paráva de andar à volta de algo que lhe pareceu ser um carrinho de bebé.
Era, sim, um carrinho de bebé. O coração batia forte à medida que se aproximava dele.
Lua ladrava incessantemente. Ele espreitou o carrinho e viu que um cobertor tapava alguma coisa.
Puxou uma ponta dele. Sim, havia uma criança lá dentro.
Olhou para todos os lados da floresta, não via ninguém.
"O que vou fazer? Estará a dormir?Estará morta?", perguntava a si próprio.
As suas mãos tocaram o rosto dela, sentiu que não estava fria.
A criança estaria ali há pouco tempo.
Olhou à sua volta. Gritou com tanta força quanto a sua voz podia " Está alguém aqui?"
Olhava a criança.
Sem pensar ou gritar mais um segundo, empurrou o carrinho em direcção à aldeia que, naquele tempo, tinha muitos habitantes.
Passou na junta de freguesia, que já estava aberta, pediu ao senhor Lima que ligasse aos bombeiros e à GNR, que viessem rapidamente buscar a criança que encontrara na floresta.
Quando chegaram, pegaram na criança, que fez um gesto com as mãozinhas, abriu os olhos e choramingou.
Estava viva!
E Lua ladrava de felicidade, a ele escorriam as lágrimas dos olhos. Naquele manhã, o coração pedia-lhe que fosse à floresta. Não imaginava que iria encontrar um bebé. Salvara-a do frio da floresta.
Quinze dias depois, soube pelo presidente da junta que a criança tinha sido abandonada, estava bem, e a Polícia Judiciária andava em investigações para descobrirem quem eram os pais.

 

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